segunda-feira, 28 de setembro de 2015

“Nunca tivemos uma geração tão triste”

Augusto Cury, o famoso psiquiatra que tem livros publicados em mais de 70 países e dá palestras para multidões no Brasil e lá fora, lançou recentemente uma versão para crianças e adolescentes do seu best-seller Ansiedade - Como Enfrentar o Mal do Século. O autor conversou com a gente sobre os desafios de se criar os filhos hoje e não poupou críticas à maneira como a família e a escola têm educado os pequenos. Confira!
Excesso de estímulos
"Estamos assistindo ao assassinato coletivo da infância das crianças e da juventude dos adolescentes no mundo todo. Nós alteramos o ritmo de construção dos pensamentos por meio do excesso de estímulos, sejam presentes a todo momento, seja acesso ilimitado a smartphones, redes sociais, jogos de videogame ou excesso de TV. Eles estão perdendo as habilidades sócio-emocionais mais importantes: se colocar no lugar do outro, pensar antes de agir, expor e não impor as ideias, aprender a arte de agradecer. É preciso ensiná-los a proteger a emoção para que fiquem livres de transtornos psíquicos. Eles necessitam  gerenciar os pensamentos para prevenir a ansiedade. Ter consciência crítica e desenvolver a concentração. Aprender a não agir pela reação, no esquema 'bateu, levou', e a desenvolver altruísmo e generosidade."
Geração triste
"Nunca tivemos uma geração tão triste, tão depressiva. Precisamos ensinar nossas crianças a fazerem pausas e contemplar o belo. Essa geração precisa de muito para sentir prazer: viciamos nossos filhos e alunos a receber muitos estímulos para sentir migalhas de prazer. O resultado: são intolerantes e superficiais. O índice de suicídio tem aumentado. A família precisa se lembrar de que o consumo não faz ninguém feliz. Suplico aos pais: os adolescentes precisam ser estimulados a se aventurar, a ter contato com a natureza, se encantar com astronomia, com os estímulos lentos, estáveis e profundos da natureza que não são rápidos como as redes sociais."
Dor compartilhada
"É fundamental que as crianças aprendam a elaborar as experiências. Por exemplo, diante de uma perda ou dificuldade, é necessário que tenham uma assimilação profunda do que houve e aprender com aquilo. Como ajudá-las nesse processo? Os pais precisam falar de suas lágrimas, suas dificuldades, seus fracassos. Em vez disso, pai e mãe deixam os filhos no tablet, no smartphone, e os colocam em escolas de tempo integral. Pais que só dão produtos para os seus filhos, mas são incapazes de transmitir sua história, transformam seres humanos em consumidores. É preciso sentar e conversar: 'Filho, eu também fracassei, também passei por dores, também fui rejeitado. Houve momentos em que chorei'. Quando os pais cruzam seu mundo com os dos filhos, formam-se arquivos saudáveis poderosos em sua mente, que eu chamo de janelas light: memórias capazes de levar crianças e adolescentes a trabalhar dores perdas e frustrações."
Intimidade
"Pais que não cruzam seu mundo com o dos filhos e só atuam como manuais de regras estão aptos a lidar com máquinas. É preciso criar uma intimidade real com os pequenos, uma empatia verdadeira. A família não pode só criticar comportamentos, apontar falhas. A emoção deve ser transmitida na relação. Os pais devem ser os melhores brinquedos dos seus filhos. A nutrição emocional é importante mesmo que não se tenha tempo, o tempo precisa ser qualitativo. Quinze minutos na semana podem valer por um ano. Pais têm que ser mestres da vida dos filhos. As escolas também precisam mudar. São muito cartesianas, ensinam raciocínio e pensamento lógico, mas se esquecem das habilidades sócio-emocionais."
Mais brincadeira, menos informação
"Criança tem que ter infância. Precisa brincar, e não ficar com uma agenda pré-estabelecida o tempo todo, com aulas variadas. É importante que criem brincadeiras, desenvolvendo a criatividade. Hoje, uma criança de sete anos tem mais informação do que um imperador romano. São informações desacompanhadas de conhecimento. Os pais podem e devem impor limites ao tempo que os filhos passam em frente às telas. Sugiro duas horas por dia. Se você não colocar limite, eles vão desenvolver uma emoção viciante, precisando de cada vez mais para sentir cada vez menos: vão deixar de refletir, se interiorizar, brincar e contemplar o belo."
Parabéns!
"Em vez de apontar falhas, os pais devem promover os acertos. Todos os dias, filhos e alunos têm pequenos acertos e atitudes inteligentes. Pais que só criticam e educadores que só constrangem provocam timidez, insegurança, dificuldade em empreender. Os educadores precisam ser carismáticos, promover os seus educandos. Assim, o filho e o aluno vão ter o prazer de receber o elogio. Isso não tem ocorrido. O ser humano tem apontado comportamentos errados e não promovido características saudáveis."
Conselho final para os pais

"Vejo pais que reclamam de tudo e de todos, não sabem ouvir não, não sabem trabalhar as perdas. São adultos, mas com idade emocional não desenvolvida. Para atuar como verdadeiros mestres, pai e mãe precisam estar equilibrados emocionalmente. Devem desligar o celular no fim de semana e ser pais. Muitos são viciados em smartphones, não conseguem se desconectar. Como vão ensinar os seus filhos e fazer pausas e contemplar a vida? Se os adultos têm o que eu chamo de síndrome do pensamento acelerado, que é viver sem conseguir aquietar e mente, como vão ajudar seus filhos a diminuírem a ansiedade?"

terça-feira, 22 de setembro de 2015

A espiritualidade dos cristãos leigos e leigas

A oração e a contemplação são muito importantes. É preciso cultivar um espaço interior  dinamizado por um espírito contemplativo que dê sentido cristão ao compromisso e às atividades. Aí, é possível um encontro significativo  com o Deus de Jesus Cristo, que nos permite descobrir que “somos depositários de um bem que humaniza” (EG, n. 264), que nos ajuda a viver uma vida nova e, portanto, a buscar esta vida nova para todos.
O verdadeiro trabalhador da vinha nunca deixa de ser discípulo. Ele sabe que Jesus caminha, fala, respira e trabalha com ele. Experimenta a importância de caminhar com Jesus, e está convencido de que constrói o novo mundo à luz do Evangelho. A experiência do encontro pessoal com Jesus, sempre renovada, é a única capaz de sustentar a missão. Por isso, ele deve dedicar tempo à oração sincera, que leva a saborear a amizade e a mensagem de Jesus (cf. EG, n. 266).
O encontro com Jesus Cristo leva a uma espiritualidade integral que contempla a conversão pessoal, o discipulado, a experiência comunitária, a formação bíblico-teológica e o compromisso missionário (cf. DAp, n. 226; 278). Neste encontro com Jesus Cristo vivo, descobre-se e vivencia-se o mistério trinitário. “Deus é amor” (1Jo 4,16), e o Amor, segundo a tradição cristã, não se contenta consigo mesmo; por isso,
envia o Filho, no Espírito Santo, em missão para anunciar uma Boa-Nova a toda humanidade. A natureza missionária  da Igreja (cf. AG, n. 2; 6) é fruto dessa vida trinitária revelada aos discípulos, os quais participam da missão de Deus no mundo: conduzidos pelo Espírito Santo, são seguidores de Jesus Cristo e testemunhas de sua ressurreição.
O amor que se mostra na imagem comunitária da Santíssima Trindade, desde toda a eternidade, desdobra-se na missão histórico-salvífica de Deus, da qual a Igreja, formada
por discípulos missionários, participa como sacramento. A missão da Igreja é motivada pela reintegração da humanidade em uma vida plena de amor. O amor de Deus busca
a face da criatura, desfigurada nesse mundo pelo pecado, em vista de outro mundo possível. “O Senhor ensina que haverá uma nova morada para o homem, onde habitará
a justiça e cuja felicidade preencherá e superará todos os desejos de paz que o coração humano alimenta” (GS, n. 39).

Estudos da CNBB 107. n.75-78

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Abraão nosso pai na Fé

A fé desvenda-nos o caminho e acompanha os nossos passos na história. Por isso, se quisermos compreender o que é a fé, temos de explanar o seu percurso, o caminho dos homens crentes, com os primeiros testemunhos já no Antigo Testamento. Um posto singular ocupa Abraão, nosso pai na fé. Na sua vida, acontece um fato impressionante: Deus dirige-lhe a Palavra, revela-Se como um Deus que fala e o chama por nome. A fé está ligada à escuta. Abraão não vê Deus, mas ouve a sua voz. Deste modo, a fé assume um caráter pessoal: o Senhor não é o Deus de um lugar, nem mesmo o Deus vinculado a um tempo sagrado específico, mas o Deus de uma pessoa, concretamente o Deus de Abraão, Isaac e Jacob, capaz de entrar em contacto com o homem e estabelecer com ele uma aliança. A fé é a resposta a uma Palavra que interpela pessoalmente, a um Tu que nos chama por nome.
Esta Palavra comunica a Abraão uma chamada e uma promessa. Contém, antes de tudo, uma chamada a sair da própria terra, convite a abrir-se a uma vida nova, início de um êxodo que o encaminha para um futuro inesperado. A perspectiva, que a fé vai proporcionar a Abraão, estará sempre ligada com este passo em frente que ele deve realizar: a fé « vê » na medida em que caminha, em que entra no espaço aberto pela Palavra de Deus. Mas tal Palavra contém ainda uma promessa: a tua descendência será numerosa, serás pai de um grande povo (cf. Gn 13, 16; 15, 5; 22, 17). É verdade que a fé de Abraão, enquanto resposta a uma Palavra que a precede, será sempre um ato de memória; contudo esta memória não o fixa no passado, porque, sendo memória de uma promessa, se torna capaz de abrir ao futuro, de iluminar os passos ao longo do caminho. Assim se vê como a fé, enquanto memória do futuro, está intimamente ligada com a esperança.
A Abraão pede-se para se confiar a esta Palavra. A fé compreende que a palavra — uma realidade aparentemente efêmera e passageira —, quando é pronunciada pelo Deus fiel, torna-se no que de mais seguro e inabalável possa haver, possibilitando a continuidade do nosso caminho no tempo. A fé acolhe esta Palavra como rocha segura, sobre a qual se pode construir com alicerces firmes. 
[...] Há ainda um aspecto da história de Abraão que é importante para se compreender a sua fé. A Palavra de Deus, embora traga consigo novidade e surpresa, não é de forma alguma alheia à experiência do Patriarca. Na voz que se lhe dirige, Abraão reconhece um apelo profundo, desde sempre inscrito no mais íntimo do seu ser. Deus associa a sua promessa com aquele «ponto» onde desde sempre a existência do homem se mostra promissora, ou seja, a paternidade, a geração duma nova vida: «Sara, tua mulher, dar-te-á um filho, a quem hás de chamar Isaac» (Gn 17, 19). O mesmo Deus que pede a Abraão para se confiar totalmente a Ele, revela-Se como a fonte donde provém toda a vida. Desta forma, a fé une-se com a Paternidade de Deus, da qual brota a criação: o Deus que chama Abraão é o Deus criador, aquele que «chama à existência o que não existe » (Rm 4, 17), aquele que, «antes da fundação do mundo, (...) nos predestinou para sermos adoptados como seus filhos» (Ef 1, 4-5). No caso de Abraão, a fé em Deus ilumina as raízes mais profundas do seu ser: permite-lhe reconhecer a fonte de bondade que está na origem de todas as coisas, e confirmar que a sua vida não deriva do nada nem do acaso, mas de uma chamada e um amor pessoais. O Deus misterioso que o chamou não é um Deus estranho, mas a origem de tudo e que tudo sustenta. A grande prova da fé de Abraão, o sacrifício do filho Isaac, manifestará até que ponto este amor originador é capaz de garantir a vida mesmo para além da morte. A Palavra que foi capaz de suscitar um filho no seu corpo «já sem vida (…), como sem vida estava o seio» de Sara estéril (Rm 4, 19), também será capaz de garantir a promessa de um futuro para além de qualquer ameaça ou perigo (cf. Heb 11, 19; Rm 4, 21).
Carta Enciclica Lumen Fidei, n.8-11.


sábado, 12 de setembro de 2015

Igualdade na diversidade

Não se pode mais falar de diferentes graus de perfeição, como se “alguns” fossem chamados a maior e outros a menor perfeição. O Concílio foi muito claro na afirmação da “vocação universal à santidade”, que advém de Cristo, fonte de toda a santidade. Se nem todos são chamados aos mesmos caminhos, ministérios e trabalhos, “todos, no entanto, são chamados à santidade” (LG, n. 32; cf. 39-40). Entre todos os membros da Igreja “reina verdadeira igualdade quanto à dignidade e ação comum a todos os fiéis na edificação do Corpo de Cristo” (LG, n. 32). Apesar do crescimento da consciência da identidade e da missão dos leigos e leigas na Igreja, que constituem a imensa maioria do povo de Deus, ainda há caminho a percorrer: “A tomada de consciência desta responsabilidade laical, que nasce do batismo e da confirmação, não se manifesta de igual modo em toda a parte; em alguns casos, porque (os leigos) não se formaram para assumir responsabilidades impor tantes, em outros por não encontrarem espaço nas suas Igrejas particulares para poderem exprimir-se e agir, por causa de um excessivo clericalismo que os mantém à margem das decisões” (EG, n. 102).   - Estudos da CNBB 107, n. 71-72

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Vocação: estar no meio do povo, às margens do centro

Vocação é escolha. E é também escolha, dentre outras, de caminhos. Ao falarmos de caminhos, percebemos uma coisa fundamental: não se é vocacionado se não se caminha. Uma pessoa parada, que não anda, não escolhe e, portanto, não chega a lugar algum. É alguém que não se arriscou e, dessa forma, jamais terá aceitado ou abraçado sua vocação.
O vocacionado, por caminhar, acaba se machucando. Inevitável! Não dá pra não ser assim. Porém, vale a pena. Tem que valer. Sonhar é arte de ferir-se em nome da plenitude.
Vocação é, também, muito mais ouvir do que falar. Quem fala demais, nunca vai descobrir sua vocação. Não descobre, porque não percebe. Quem nos grita a vocação, além do sopro interior, é a boca do irmão. Saber ouvir o clamor do outro nos indica o caminho a seguir. É como Maria chamando a Jesus em Caná. É também como a outra Maria e a irmã Marta, que chamam Jesus para salvar Lázaro, em Betânia. Quem ouve sabe que, por vezes, é preciso mudar os rumos. O chamado sobrepõe-se à vontade própria. Um vocacionado deixa o "eu" em segundo plano.
Aí vai outra coisa que penso sobre vocação: não é possível ser vocacionado sem esvaziar-se de si. Não quer dizer que deva faltar amor próprio. Jamais! Porém, o vocacionado não se vangloria e sabe que é preciso se diminuir em favor de um algo maior. E isso vale para qualquer vocação. Ou seja, se uma pessoa não saiu de seu mundinho, nunca terá descoberto sua vocação. É preciso entender que só se enxerga a si mesmo quando sabemos ler o espelho no olhar do outro.
Vocação a amar é universal. E a este chamado todo mundo tem que responder. E não é "amorzinho". É amor pleno. Amor que rompe, faz tremer e subjuga a ordem. Só pelo amor é que se descobre a vocação verdadeira. Aquela que nos faz ver que, atendendo aos chamados, seremos felizes.
Vocação é ter projeto, mas é também saber sentir os rumos dos ventos. É entender que, às vezes, a missão é uma quarentena de deserto e não uma vida inteira de leite e mel na Terra Prometida. Vocação é enfrentar estruturas que matam, mesmo sabendo que o resultado pode ser a cruz. Vocação é ter paciência, mesmo quando tudo parece ter sido destruído. É também aprender a se virar numa terra estrangeira, mesmo que a saudade aperte. Sobretudo, é aceitar chamados sem desculpas de "que não darei conta". Dessa forma, seremos como Moisés, Jesus, Jó, José do Egito e Maria. Símbolos de vocação, que nos ensinam, nos inspiram e nos provocam.
Afinal, não há vocação sem profundas provocações. Provoque-se.
VINÍCIUS BORGES GOMES - Diocese de Oliveira


terça-feira, 8 de setembro de 2015


A luz da fé

Urge recuperar o caráter de luz que é próprio da fé, pois, quando a sua chama se apaga, todas as outras luzes acabam também por perder o seu vigor. De fato, a luz da fé possui um caráter singular, sendo capaz de iluminar toda a existência do homem. Ora, para que uma luz seja tão poderosa, não pode dimanar de nós mesmos; tem de vir de uma fonte mais originária, deve porvir em última análise de Deus. A fé nasce no encontro com o Deus vivo, que nos chama e revela o seu amor: um amor que nos precede e sobre o qual podemos apoiar-nos para construir solidamente a vida. Transformados por este amor, recebemos olhos novos e experimentamos que há nele uma grande promessa de plenitude e se nos abre a visão do futuro. A fé, que recebemos de Deus como dom sobrenatural, aparece-nos como luz para a estrada orientando os nossos passos no tempo. Por um lado, provém do passado: é a luz duma memória basilar — a da vida de Jesus –, onde o seu amor se manifestou plenamente fiável, capaz de vencer a morte. Mas, por outro lado e ao mesmo tempo, dado que Cristo ressuscitou e nos atrai de além da morte, a fé é luz que vem do futuro, que descerra diante de nós horizontes grandes e nos leva a ultrapassar o nosso « eu » isolado abrindo-o à amplitude da comunhão. Deste modo, compreendemos que a fé não mora na escuridão, mas é uma luz para as nossas trevas.
Carta Enciclica Lumen Fidei, n. 2

domingo, 6 de setembro de 2015

Rumo a uma noção integral do sujeito cristão

Para vivenciar uma noção integral do sujeito cristão, faz-se necessário dar passos no sentido de superar antagonismos que estão enraizados em muitas mentalidades.
O primeiro é o antagonismo entre a fé e a vida. Segundo esta noção, o mundo da fé é superior e, até mesmo, oposto ao mundo da vida. Por fé, entende-se, segundo esta concepção, tudo o que se relaciona ao mundo espiritual, ao culto e aos sacramentos. No outro lado, estaria a vida comum de todos: o trabalho, as funções e os compromissos
familiares, a educação dos fi lhos, o mundo da política etc. (cf. GS, n. 43).
Jesus nos indica que tudo, menos o pecado, pode ser mediação do amor de Deus. É precisamente no mundo da vida que o amor de Deus se manifesta, como nos mostram os Evangelhos. Jesus não frequentava apenas as sinagogas (espaço da “fé”), mas também atuava em barcas, na margem do lago, nas casas, na cidade, nos caminhos. Diante do Evangelho de Jesus, podemos dizer que não há nada propriamente profano, porque tudo pode ser mediação desta manifestação da misericórdia maravilhosa de Deus, que vai além de todo entendimento e transforma as pessoas.
Outro antagonismo é o de Igreja-mundo. Segundo esta perspectiva, a Igreja seria uma instância superior e, até mesmo, oposta ao mundo. Esta relação de oposição e exclusão
não pertence ao núcleo do Evangelho nem à perspectiva do Concílio Vaticano II. Ao contrário, reconhecer o fato da Encarnação – o mistério de Deus conosco, comprometido com nossa história a tal ponto de dar-nos o Filho, fazendo-se um de nós e assumindo em tudo a humanidade, menos o pecado – faz-nos valorizar este único mundo e esta única história que nos compete viver, unidos a todo o gênero humano. A Igreja está comprometida com este mundo, como sacramento e sinal do amor e da misericórdia de Deus para com todos (cf. LG, n. 1), e, nesta missão, peregrina até que o Reino de Deus se manifeste plenamente em novo céu e nova terra.
Há também antagonismos persistentes entre identidade eclesial e ecumenismo, missão e acolhida do outro. O diálogo é uma postura inerente à natureza e missão da Igreja no mundo e não simplesmente uma estratégia de evangelização. “O diálogo não só foi iniciado, mas tornou--se uma expressa necessidade, uma das prioridades da Igreja” (UUS, n. 31).
A dicotomia entre Igreja e mundo e entre fé e vida está na raiz da atitude de valorização unilateral dos ritos, em detrimento da responsabilidade social e da luta pela justiça.

Se orientado por esta divisão, o mesmo cristão, que valoriza os ritos, pode apresentar comodismo, indiferença e até incoerência em sua vida de cidadão do mundo. O Papa Francisco questiona que “apesar de se notar a participação de muitos nos ministérios laicais, este compromisso não se refl ete na penetração dos valores cristãos no mundo social, político e econômico; limita-se muitas vezes a tarefas no seio da Igreja, sem um empenhamento real pela aplicação do Evangelho na transformação da sociedade” (EG, n. 102). Tudo isto nos leva a considerar que o cristão nunca pode ser visto isoladamente de seus enraizamentos básicos, enquanto pessoa humana: sujeito relacionado com outros e inserido neste único mundo em que vivemos, e de cujo destino inevitavelmente participamos. No entanto, lembra-nos a Carta a Diogneto: “ (os cristãos) vivem na sua pátria, mas como forasteiros; participam de tudo como cristãos e suportam tudo como estrangeiros. Toda pátria é pátria deles, e cada pátria é estrangeira” (cf. cap.V). 
Estudos da CNBB nº 107, n.62-68

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Mês da Bíblia

Neste mês de setembro, mês da Bíblia,
vamos reler alguns trechos da mensagem da XXI Jornada Mundial da Juventude
 que fala sobre a importância da Palavra de Deus
na vida cristã e de modo especial na vida dos jovens