O caminho quaresmal de
preparação para a Páscoa cristã começa com o gesto de penitência da imposição
das cinzas na quarta-feira de Cinzas, e termina com o início do Triduo Pascal
na noite da Quinta-feira Santa, com a celebração da Missa da Ceia do Senhor.
Desde o Antigo
Testamento, as cinzas são um símbolo da
morte, da dor, do arrependimento, da penitência e do desejo de conversão para
demonstrar a disposição pessoal de se reconciliar com Deus. As cinzas
significam a transitoriedade da vida humana sobre a terra e, ainda, o sentido
passageiro de toda realidade material.
Como escreve o livro do Génesis no capítulo 3 versículo 19 “Porque tu és pó e
ao pó as de voltar”. A celebração das cinzas abre para nós o período onde somos
chamados de forma mais intensa a conversão de nosso coração a Deus.
O papa Bento XVI na
homilia da quarta-feira de cinzas de 2007 afirmava que a “liturgia da Quarta-Feira de Cinzas indica
assim na conversão do coração a Deus a dimensão fundamental do tempo quaresmal.
Esta é a chamada muito sugestiva que nos vem do tradicional rito da imposição
das cinzas. Rito que assume um dúplice significado: o primeiro relativo à
mudança interior, à conversão e à penitência, enquanto o segundo recorda a
precariedade da condição humana, como é fácil compreender das duas fórmulas
diversas que acompanham o gesto".
Nos
Evangelhos, Jesus indica quais são os instrumentos úteis para realizar a
autêntica renovação interior e comunitária: as obras de caridade (a esmola), a
oração e a penitência (o jejum). São as três práticas fundamentais queridas
também à tradição hebraica, porque contribuem para purificar o ser humano aos olhos
de Deus.
Bento XVI, em 2007, ao falar sobre o jejum como prática quaresmal, afirmava que não podemos ter como base motivações de ordem física ou estética. Mas, motivações que brotam da "exigência que o
homem tem de uma purificação interior; que o eduque para aquelas renúncias
saudáveis que libertam o crente da escravidão do próprio eu; que o torne mais
atento e disponível à escuta de Deus e ao serviço dos irmãos. Por esta razão o jejum
e as outras práticas quaresmais são consideradas pela tradição cristã 'armas' espirituais para combater o mal, as paixões negativas e os
vícios. A este propósito, apraz-me ouvir de novo convosco um breve comentário de
São João Crisóstomo. 'Como no findar do Inverno escreve ele volta a
estação do Verão e o navegante arrasta para o mar a nave, o soldado limpa as
armas e treina o cavalo para a luta, o agricultor lima a foice, o viandante
revigorado prepara-se para a longa viagem e o atleta depõe as vestes e
prepara-se para as competições; assim também nós, no início deste jejum, quase
no regresso de uma Primavera espiritual forjamos as armas como os soldados,
limamos a foice como os agricultores, e como timoneiros reorganizamos a nave do
nosso espírito para enfrentar as ondas das paixões. Como viandantes retomamos a
viagem rumo ao céu e como atletas preparamo-nos para a luta com o despojamento
de tudo' (Homilias ao povo antioqueno, 3)”.
Na catequese apresentada nessa Quarta de Cinzas o papa tomou como ponto de partida as tentações sofridas por Jesus no deserto cf. Lc 4,1-13.
Das tentações que Jesus sofreu nasce, afirma Bento XVI, "um convite para cada um de nós a responder a uma pergunta
fundamental: o que conta verdadeiramente na nossa vida? [...] Qual é o núcleo das
três tentações que sofre Jesus? É a proposta de manipular Deus, de usá-Lo para
os próprios interesses, para a própria glória e o próprio sucesso. E também, em
sua essência, de colocar a si mesmo no lugar de Deus, removendo-O da própria
existência e fazendo-O parecer supérfluo. Cada um deveria perguntar-se então:
que lugar tem Deus na minha vida? É Ele o
Senhor ou sou eu? Superar a tentação de submeter Deus a
si e aos próprios interesses ou de colocá-Lo em um canto e converter-se à justa
ordem de prioridade, dar a Deus o primeiro lugar, é um caminho que cada cristão
deve percorrer sempre de novo. 'Converter-se', um convite que escutamos muitas
vezes na Quaresma, significa seguir Jesus de modo que o seu Evangelho seja guia
concreta da vida; significa deixar que Deus nos transforme, parar de pensar que
somos nós os únicos construtores da nossa existência; significa reconhecer que
somos criaturas, que dependemos de Deus, do seu amor, e somente “perdendo” a
nossa vida Nele podemos ganhá-la. Isto exige trabalhar as nossas escolhas à luz
da Palavra de Deus. Hoje não se pode mais ser cristãos como simples
consequência do fato de viver em uma sociedade que tem raízes cristãs: também
quem nasce de uma família cristã e é educado religiosamente deve, a cada dia,
renovar a escolha de ser cristão, dar a Deus o primeiro lugar, diante das
tentações que uma cultura secularizada lhe propõe continuamente, diante ao
juízo crítico de muitos contemporâneos".
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