A vida humana é uma autêntica peregrinação. A palavra peregrino refere-se a alguém que caminha cruzando os campos. Nascer é a nossa primeira experiência de peregrinos, e, ao nascer, todos temos algo de heróis. A morte, por sua vez, será a nossa última etapa do caminho. Partir e chegar é o enredo da nossa existência cujo movimento nos conduz ao Criador, origem e meta de toda a criação.
Qual o sentido desta nossa peregrinação? O segredo da felicidade humana está na experiência exultante de se sentir amado, gratuita e infinitamente, pelo nosso Criador. Um sentido de presença amorosa e mística faz a pessoa livre, feliz, esperançosa e solidária. Benditos sejam os mestres humildes que, na volta dos caminhos da vida, nos fazem acessível á essa lição elementar de sabedoria. Posso mencionar muitos nomes. Cito aqui dona Magda, camponesa que, nos seus 74 anos, percorria léguas toda Semana Santa para participar das celebrações no interior de Minas. Conversando com ela, perguntei admirado:
- Dona Magda, a senhora parece que vive pensando em Deus o dia todo!- Mas é claro, seu padre! Só não penso em Deus quando estou dormindo. Ao levantar, coloco os meus pés no chão, e faço esta oração: Meu Deus, faz que todos os meus passos no dia de hoje sejam dados no seguimento de Jesus!
Todo dia lembro desta bela oração. Dona Magda é um modelo de peregrina. Pés curtidos, pele calejada e queimada pelo sol, chinelos, léguas, pobreza, liberdade, amor e uma fé que transporta montanhas! Confesso: sinto inveja de pessoas assim.
Faz bem pensar, de vez em quando, no humilde e luminoso início do nosso existir. Sentir a admiração de sermos um milagre da criação divina. Imagina! Passar do nada para o ser! Há maravilha maior? Um ser tão rico que é chamado a peregrinar para a eternidade em relação com tanta coisa, pessoa e o próprio Deus trino.
A criação toda é um tu em constatne relação com o eu que somos cada um de nós. Alguém único e ao mesmo tempo parte de um todo. Somos parte do grande corpo da Criação. [...] Como é bonito refletir e saborear toda esta vocação à fraternidade e à comunicação.
Ao captarmos a vida como um dom, cresce em nós a confiança em Deus. A confiança dá a medida do nosso amor. Confiança que desvanece os medos e aviva a coragem para prosseguir a caminhada. Quem contempla o Deus presente a cada passo da nossa vida aprende a saborear o seu amor ao partilhá-lo com as outras criaturas. Tanta alegria e tantas maravilhas não podem ser aprisionados para si. Como anunciar aos outros esse amor, esse sentido para a criação? É este o desafio da evangelização, sempre atual e sempre novo.
A nossa peregrinação termina com a morte. A melhor definição da morte foi-me dada por uma pessoa que, sentindo-a perto, a descreveu como um novo nascimento.
- Quando a criança está no ventre materno ela se sente bem e protegida; ela não quer nascer. Não sabe que está perdendo algo muito melhor. Assim considero a nossa morte. Mesmo na doença e com sofrimentos, eu gosto da vida e amo minha família e meus amigos. Tenho, porém, certeza de que vou nascer para uma vida melhor, para a qual não há palavras para descrever. Por isso não tenho medo da morte.
Manuel E. Iglesias, sj
Extraído do livro: Onde estás, Senhor?
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