Para os monges a tentação pertence essencialmente à sua vida. O patriarca Antão expressa isso da seguinte maneira: "A maior obra dos homens é esta: ser capaz de manter seus pecados dante de Deus e estar preparado para a tentação até o último suspiro" (Apot 4).
A vida humana é marcada por conflitos constantes. Nós não podemos simplesmente vegetar. Devemos enfrentar os ataques que a vida eventualmente nos apresentar. E nunca haverá um momento em que possamos descansar sobre os louros da vitória. As tentações, ao contrário, haverão de nos acompanhar até o fim da vida. Ainda num outro lugar diz o patriarca Antão: "Quem não tiver sido tentado não pderá entrar no reino do céu. Se suprimires a tentação, ninguém se salvará" (Apot 5). Segundo o patriarca Antão as tentações são manifestamente uma condição indispensável para se entrar no reino do céu. É através das tentações que o homem obtém um faro do Deus verdadeiro. Sem as tentações estaria no perigo de apoderar-se de Deus e torná-lo inofensivo e inócuo. Pela tentação, porém, o homem experimenta existencialmente a sua distância de Deus, sente a diferença entre o homem e Deus. O homem permanece em luta constante, enquanto Deus repousa em si mesmo. Deus é amor absoluto, enquanto o homem é continuamente tentado pelo maligno.
Os monges vêem as tentações como plenamente positivas. Um dos patriarcas exprime isso da seguinte maneira: "Se a árvore não é agitada pelo vento, ela não cresce nem cria raízes. O mesmo acontece também com o monge se ele não é tentado e não suporta a tentação, ele não se torna homem" (N 396).
É como a história que se conta a respeito de uma palmeira. Certa vez, um homem muito mau irritou-se com uma palmeira nova e bela. E, a fim de prejudicá-la, colocou uma enorme pedra sobre a sua copa. Depois de alguns anos, porém, ao passar diante dela, viu que ela se tornara bem maior e mais bonita do que todas as outras à sua volta. A pedra forçara a lançar suas raízes ainda mais profundamente para dentro da terra. E, desse modo, ela também pôde crescer bem mais alto que as demais. O mesmo se dá com as tentações, isto é, elas são um desafio para o monge. Elas obrigam-no a cravar suas raízes ainda mais profundamente em Deus e a depositar sua confiança cada vez mais nele. Porque as tentações lhe mostram que, a partir de suas próprias forças, ele é incapaz de dar conta delas. Os conflitos constantes tornam-no interiormente mais forte e fazem-no amadurecer como homem.
A luta com as provações e tentações pertence essencialmente ao ser humano. Nós devemos contar com o fato de sermos tentados pelas nossas paixões. Os monges falam de demônios que vem lutar conosco. Eles querem dizer com isso que surgem forças capazes de nos levar numa direção que nós conscientemente não gostaríamos de tomar. Eles fazem a experiência de que podemos nos equivocar, sendo então atingidos de um lado para o outro por pensamentos e sentimentos diferentes. Desse modo caracterizam as forças que nos desviaram para as sombras, para o inconsciente. E, apesar de nossas tentativas e apesar de sermos pessoas descentes, surge em nós a intenção de desvencilhar-nos de tudo isso e de deixar definitivamente todos os mandamentos de lado. [...] Em nosso interior há um conflito entre o bem e o mal, entre o claro e o escuro, entre o amor e o ódio. Para os monges, isso é algo absolutamente normal e não é um mau, mas prova e confirma o ser humano. Talvez hoje em dia preferíssemos dizer: um ser humano assim vive mais conscientemente, ele está mais ciente de suas regiões sombrias e conta com o fato de continuarem a habitar em seu inconsciente forças que ele ainda não conhece e que devem ser tratadas por ele com todo o cuidado.
As tentações, assim dizem os monges, levam-nos ao encontro de nossa humanidade. Elas nos fazem entrar em contato com as raízes que sustentam o tronco. Colocar-se diante das tentações significa: confrontar-se com a verdade. Um dos patriarcas expressa a este respeito da seguinte maneira: "Sem as tentações ninguém será santo, pois aquele que foge do proveito da tentação também foge da vida eterna. Com efeito, tentações há que prepararam aos suas as suas coroas" (N595).
Fonte: Anselm Grun - Trecho do livro O céu começa em você, editora Vozes. p. 43-45.
Nenhum comentário:
Postar um comentário