Século VI a.C.O povo está no cativeiro da Babilônia e tenta reler as grandes figuras do passado. Busca nelas alguma luz para clarear a escuridão em que se encontrava. Ao reler a história de Elias, o povo do cativeiro olhava não só o lado exterior e grandioso deste grande profeta, mas também, e sobretudo, o lado interior e escondido das suas crises e dúvidas. O estado de depressão em que Elias ficou ao fugir diante da ameaça da rainha Jezabel era um espelho da situação de crise e de dúvida em que eles mesmo se encontravam no cativeiro. É a crise e a dúvida de muitos de nós: "Elias [...] sentou-se, finalmente, debaixo de um junípero e pediu para si a morte, dizendo: 'agora basta, Senhor! Tira a minha vida, pois não sou melhor que meus pais'. E, deitando-se no chão, adormeceu à sombra do junípero. De repente, um anjo tocou-o e disse: 'Levanta-te e come!'. Ele abriu os olhos e viu junto à sua cabeça um pão assado na pedra e um jarro de água. Comeu, bebeu e tornou a dormir" (1Rs 19,2-6).
Elias só quer comer, beber e dormir. Como muitos dos exilados na Babilônia, Elias tinha perdido o sentido da vida. O anjo voltou uma segunda vez e, finalmente, Elias desperta, reencontra a força e caminha, quarenta dias e quarenta noites, até chegar ao monte Horeb ou Monte Sinai (1Rs 19,4-8), onde, séculos antes, naquele mesmo lugar, havia nascido o Povo de Deus (Ex 19,1-8). Elias volta às raízes! Era esta a caminhada que o povo do cativeiro devia fazer: voltar às raízes para poder redescobrir e reabaste.cer a vocação! Hoje existem muitos anjos e "anjas" a bater na porta do nosso coração para nos acordar e fazer assumir a vocação.
No monte Horeb, Deus o interpela: "Que fazes aqui Elias? [...] Ele respondeu: 'estou ardendo de zelo pelo Senhor, Deus dos exércitos, porque os israelitas abandonaram tua aliança, demoliram teus altares e mataram à espada teus profetas. Só eu escapei. Mas agora, querem matar-me também" (1Rs 19,10.14).
Existe uma contradição entre o discurso e a prática. Conforme o discurso, Elias é o único que sobrou, mas na prática havia sete mil que não tinham dobrado o joelho diante de Baal (1Rs 19,18). Conforme o discurso, Elias está cheio de zelo; mas na prática mostra um homem medroso que foge (1Rs 19,3). Conforme o discurso, ele sabe analisar o fracasso da nação; mas na prática não sabe analisar o seu próprio fracasso, pois nem percebe a presença do anjo.
O chamado
O olhar de Elias estava perturbado por algum defeito que o impedia de avaliar a situação com objetividade e perceber a vocação de Deus. Não é que ele tivesse perdido a fé, mas já não sabia enfrentar a realidade nova com a fé antiga. Havia algo de comum entre Elias e seus perseguidores: ambos matavam em nome de Deus! Foi em nome de Deus que Elias matou os 450 profetas de Baal (1Rs 18,40). Foi em nome de deus (Baal) que Jezabel matou os profetas de Javé. Havia algo errado na imagem de Deus que animava Elias na sua luta contra Baal. Por isso seu olhar estava perturbado, incapaz de avaliar a situação com objetividade.
Como descobrir os enganos que nos impedem de perceber a vocação, o chamado de Deus? Qual a imagem de Deus que deveria estar hoje em nós? Esta era e continua sendo a pergunta fundamental. A resposta é dada em seguida na história da brisa leve.
Autoria: Carlos Mesters - Vai! Eu estou contigo! Paulinas, p. 34-36.
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