Olá pessoal. Sou Ariel, padre da Fraternidade dos Padres Operários Diocesanos, nascido na cidade de Tucumán, norte da Argentina. Atualmente trabalho na Paróquia São Pedro e São Paulo, em São Bernardo do Campo-SP, na Diocese de Santo Andre. Quando me pergunto: como cheguei a morar nestas terras? Como nasceu minha caminhada vocacional? Porque viver o sacerdócio nesta família concreta? Porque o trabalho com a juventude e as vocações?, recordo, isto é, passa pela minha mente e pelo coração, um monte de experiências vividas.
Quando alguém me pergunta por que sou padre, a pergunta seguinte, geralmente é: na tua família tem outros padres ou religiosos? Seguida de uma pergunta afirmação: tua família é muito católica e praticante não é!! Parece que a vocação sacerdotal só nasce em famílias envolvidas totalmente na vida de fé Católica. Se isso fosse uma verdade, Deus não continuaria chamando nos dias de hoje jovens de famílias pertencentes a Igrejas diferentes, com pessoas não praticantes e, as vezes, desestruturadas.
Acredito que posso começar a responder a tantas perguntas lembrando uma cena cômica de minha primeira infância. Meu pai e minha mãe, tentando explicar que Deus era meu Pai e, ao mesmo tempo, o Pai de meu pai. Coisa difícil de responder à uma mente curiosa de criança que não se conforma com qualquer resposta. Por outro lado, lembro a oração do Anjo da Guarda rezada todas as noites, apreendida de meus pais, para tirar o medo da escuridão. Acredito que meus pais nem imaginavam que esses ensinamentos, às vezes frustrantes para eles, poderia ser o começo de um relacionamento fecundo com Deus. Não me lembro muito de ter participado de muitas missas em família. De fato, minha família não era muito assídua a vida em comunidade.
Mais tarde, lembro de ter participado de um time de futebol chamado “Los Pumas” (onças), onde apreendi a desenvolver minhas capacidades: jogar em equipe, sonhar com uma conquista, treinar para ficar mais preparado e o conselho de um “tio”, chamado Mario, que com carinho entregava seu tempo à essas crianças que, por serem da periferia, não tinham muitas oportunidades. Essa experiência foi marcante na maneira de como viver as coisas no futuro. Se devo procurar as raízes de minha opção pela vida em fraternidade e o trabalho em equipe, com certeza posso encontrá-la na participação do time.
Logo, como culturalmente manda os bons costumes, me preparei e fiz a primeira comunhão, tentei fazer a crisma, sem conseguir na primeira tentativa por causa de outros interesses. Mas, tudo isso sem muito incentivo familiar. Lembro de ter participado de algumas missas por insistência das catequistas e para ficar mais calmo quando tinha problemas de consciência ao ficar muito danado. Mas, o que marcou minha vida de fé, já na adolescência, foram as aulas de religião na escola. O professor Manuel, era diferente, tinha uma linguagem diferente. Ele nos apresentava uma religião ligada à vida, as problemáticas sociais, mostrando qual era a vontade de Deus para nós como pessoas e para a sociedade marcada por tanta desigualdade. Comecei a perceber que a pobreza e a desigualdade não era vontade de Deus e isso me enchia de indignação. Foi surgindo o desejo de fazer alguma coisa. Não podia ficar do mesmo jeito.
Nesse tempo recebi o convite para participar do grupo missionário composto por jovens, que nas férias de verão e de inverno visitava as comunidades das montanhas que eram muito excluídas. Nesta experiência, das visitas missionárias, fui descobrindo outra realidade. Pessoas mergulhadas na pobreza, excluídas, exploradas e sem oportunidades. A comunidade nos acolhia com o coração aberto e expressava o desejo de serem acompanhadas mais de perto pelo padre, que era distante das pessoas e não conseguia acompanhar esses desejos de mudança. A falta do padre sentida por essas comunidades levou-me, pela primeira vez, a me perguntar se Deus não me chamava a ser padre. Mas imediatamente tentava atirar longe essas idéias “doidas”. De fato eu queria estudar para ter um bom emprego, ter minha esposa, meus filhos.
Nesse tempo, fui me envolvendo, cada vez mais, com a vida da comunidade, entrosando-me na pastoral da juventude paroquial e no Centro de Estudantes da escola. A vida em comunidade e a participação social, começou a ocupar quase todo meu tempo. Sentia-me realizado. Esse envolvimento me ajudou a conhecer-me mais, a fortalecer os vínculos de amizade, a namorar de uma maneira mais consciente, conhecer minha fé, fazer experiência de oração, encaminhar minha indignação social e a mudar meu projeto inicial de vida que era muito influenciado pelo entorno e a mídia. Pensava ter minha família, mas minha vida teria que orientar-se de outra maneira. Agora desejava estudar serviço social para transformar a realidade, aperfeiçoar meu trabalho pastoral a até, dedicar-me à política. No meio disso a pergunta pela possível vida sacerdotal foi crescendo e até comecei a pensar seriamente, que minha vida estaria orientada para o serviço do povo. Mas como: sendo padre o leigo? Qual seria minha presença no meio social? Mas esse serviço social foi orientando-se para a juventude, e na capacitação de lideranças, de “agentes multiplicadores” como dizíamos insistentemente na época.
Quando foram surgindo às inquietações, tive a graça de ser acompanhado pelo padre responsável da Pastoral Vocacional da paróquia que acompanhava mais outros três jovens. Tínhamos o coração inquieto, questionados diante de tantas dúvidas vocacionais. O tempo de discernimento foi fecundo e diante das opções que tínhamos me arrisquei a aprofundar o discernimento no seminário. Pensava comigo mesmo, “se não der certo, se Deus não me chama para ser padre, volto e continuo minha caminhada de serviço na comunidade e na sociedade”. De fato, dos colegas que estavam em discernimento fizemos diferentes opções. Eu entrei no seminário; outro optou por preparar-se estudando serviço social; outro se dedicou às ciências biológicas e, o último, decidiu preparar-se seriamente para formar uma família a curto prazo. O acompanhamento vocacional foi decisivo para nossa caminhada, isto é, para que cada um pudesse descobrir a que Deus nos estava chamando, que em definitivo, é o caminho da felicidade e da realização pela consagração ao projeto divino.
Para ingressar no seminário da Fraternidade dos Padres Operários Diocesanos, família pela qual cresci na fé e me identifiquei vocacionalmente, tive que deixar minha cidade para morar em Buenos Aires. O tempo de seminário foi um tempo intenso de descobertas e de construção de um “sonho”, de pessoa, de Igreja e da mesma Fraternidade. Foram muitas experiências que me fizeram crescer, primeiramente como cristão e, logo, no discernimento vocacional específico. Dentre elas posso citar a convivência no seminário, a faculdade, as paróquias de pastoral, o “choque” cultural, a participação em reivindicações sociais, o acompanhamento espiritual e dos formadores, a resignificação do relacionamento com a própria família na distancia, as crises vocacionais, os conflitos na pastoral, a fraternidade com os padres, os momentos de oração pessoal e comunitária e finalmente, a identificação com um projeto de Igreja e de sociedade encontrado nos Padres Operários.
Quando acabei os estudos pelo ano 2003, comecei a etapa pastoral na paróquia Montserrat de Tucumán até a ordenação diaconal em 19 de março de 2004. Logo depois da ordenação tive a graça de ser convidado a trabalhar no Brasil, mais especificamente na paróquia São Geraldo Magella, em São Bernardo do Campo na Diocese de Santo Andre. Na paróquia, situada na periferia e com 15 comunidades, fui preparando-me para a ordenação presbiteral. O tempo de preparação para a ordenação foi como uma experiência de “transfiguração”, porque tive a graça de ver materializado na vida das comunidades uma Igreja ministerial, comprometida com os mais pobres, sem medo de ser criativa nas propostas, preocupada com a coerência de vida e animada pelo testemunho e o sangue do Pe. Leo Commissari, padre da diocese de Imola, Itália, assassinado pelos traficantes pelo seu compromisso com a juventude. Por outro lado, o contato com consagrados e consagradas no Instituto de Pastoral Vocacional nas formações, escolas vocacionais e reuniões, me ajudaram a acreditar na possibilidade real de comunhão das vocações a serviço do Reino. Tudo foi me ajudando de um jeito ou outro a ver no dia a dia aquilo que tinha vislumbrado no tempo de seminário. Por isso, posso dizer que realmente foi uma experiência de “transfiguração”, de confirmação do caminho vocacional escolhido. Esta experiência foi tão marcante que decidi celebrar e viver a ordenação presbiteral no Brasil. A ordenação aconteceu no dia 19 de março de 2005, pelas mãos de Dom Jose Bertanha, bispo de Registro.
Em ano 2008 aconteceu a divisão da paróquia e, desde 2009 estamos na atual paróquia. Além da vida paroquial hoje tenho a graça de trabalhar com a juventude, na formação de lideranças; no seminário diocesano com a formação humana afetiva; na formação dos leigos dando aulas no Instituto de teologia para leigos da diocese. Hoje, após seis anos de vida como padre, também com a passagem de momentos difíceis, posso dizer que “opto novamente” por ser padre e ser Padre Operário Diocesano. Que a leitura desta partilha da experiência de discernimento vocacional na minha vida, anime e encoraje você nessa bonita experiência de procurar a vontade de Deus para tua vida. Que Deus te abençoe.
Pe. Ariel Alberto Zottola - Padre Operário Diocesano